Presente de Dia das Mães

[Cecília Troiano]

Se perguntássemos a nossas avós, na época em que elas tinham por volta de 30/40 anos, qual presente gostariam de ganhar no dia das mães, a lista que elas fariam, provavelmente, seria recheada de itens voltados para a casa e o bem estar da família.

Pediriam uma batedeira nova, flores para enfeitar a sala, um fogão ou outro super lançamento que deixasse a família mais feliz. Nessa época, a realidade era bem diferente da que vivemos atualmente. Até aí, nenhuma novidade.

O que mais me surpreende hoje, para essa mesma pergunta feita para mães que trabalham, é que as respostas apontam um desejo que vai além apenas da esfera doméstica. Os “pedidos” das equilibristas revelam uma enorme vontade de ter mais tempo! O maior sonho das equilibristas é ter horas disponíveis. E não é para menos. Da época das nossas avós para cá, só fomos acumulando atividades sem abrir mão de quase nada. Claro que hoje temos um arsenal de eletrodomésticos para facilitar a vida doméstica, mas nem por isso temos menos trabalho. Vivemos em atividade constante, dentro e fora de casa. Trabalhamos em jornadas duplas ou triplas. Seguimos sendo as principais responsáveis pela casa, pelo controle do que falta na despensa, pelo uniforme da escola dos filhos, pelo preparo do jantar. E ainda temos, cada uma a seu jeito, nossas atividades profissionais. Ufa! É coisa para super mulher. Pelo menos é assim que nos sentimos, um pouco heroínas de nossos mundinhos.

E o que fariam as equilibristas com mais tempo? Fiz essa pergunta para uma centena de equilibristas e, a partir das respostas que ouvi, organizei em quatro áreas de “desfrute” do tempo.

1. “Eu ficaria mais tempo com meus filhos.” Boa parte das equilibristas sente que, se pudesse ter mais horas, usaria esse bônus para ficar com os filhos. Sem dúvida, há um sentimento de débito nosso em relação a eles. É comum acharmos que estamos “devendo” atencão para nossos filhos. Presenteá-los com essas horas a mais, para esse grupo de equilibristas, seria uma forma de acalmar nossa consciência. E, claro, aproveitar a companhia dos filhos é muito prazeroso também! Disso, poucas mães duvidam. Esse grupo de mulheres, em pesquisa que fiz para o livro “Vida de Equilibrista: dores e delícias da mãe que trabalha”, representa algo em torno de 60% do total.

2. “Eu ficaria mais tempo com meu marido.” Sim, eles também têm algum espaço, pelo menos para 20% das equilibristas. Um jantar a dois, um passeio romântico pelo parque, um cineminha básico ou ficar rolando na cama num domingo de manhã! Coisas para fazer com o marido não faltam!

3. “Eu daria um jeito na minha casa.” Pois é, mesmo evitando lembrar disso, ainda temos a casa para cuidar! Dar um “tapa” na decoração ou cuidar das tarefas diárias como limpar, lavar e passar (chato demais!) também precisam do tempo das equilibristas, mesmo contra a vontade da maioria. São 10% das equilibristas que usariam suas horas livres para isso. Nem sei se é por obrigação apenas ou existe alguma curtição nessa opção.

4. “Eu usaria essas horas para mim!” Acredite, 10% das mulheres, sem culpa ou remorsos, iriam se doar esse tempinho livre! Um viva para elas! Com certeza, alternativas de como usar essas horas não faltam. Algumas querem apenas dormir sem parar. Outras se deliciariam com uma circulada pelo shopping com as amigas ou uma caminhada descompromissada pela praia. Um dia num SPA ou uma massagem… que delícia!

Faça essa pergunta a você mesma e veja em qual dos grupos você se encaixa. Mas não comece a ficar feliz de antemão. A primeira tarefa é conseguir alguém (ou talvez isso precise partir de nós mesmas) para nos presentear com essas horas a mais. Afinal, o que pedimos foi mais tempo. E, pelo jeito, alternativas para usar essas horinhas abençoadas não faltarão.

Podem soltar o cronômetro e ir atrás do nosso presente de dia das mães. Nós merecemos, disso ninguém duvida. Feliz dia das mães!

Qual o sonho da equilibrista?

[Maria Tereza Maldonado]

Para a consultora e psicoterapeuta Maria Tereza Maldonado, as equilibristas sonham com a redução da sobrecarga de trabalho, que vivenciam em várias frentes.

Para isso, não apenas a divisão igualitária de tarefas com os companheiros e filhos se faz necessária, mas uma reengenharia do tempo e uma transformação profunda no mundo do trabalho e das convenções sociais.

O que você observa na sua vivência com as mães que trabalham?
Percebo que quando a mulher é mãe e profissional, o equilíbrio é uma meta difícil de atingir. Recentemente fiz palestras para empresas tão diversas quanto o Bradesco, a Michelin e uma refinaria em Cubatão, para públicos bem diferentes entre si, mas o conflito principal de todas as mulheres parece ser a administração do tempo e como mudar a postura do homem, que ainda é apenas participante na esfera doméstica. Afinal, se as mulheres de hoje são provedoras e ‘cuidadoras’, os homens também deveriam ser.

Qual seria então o maior sonho da mulher da atualidade?
Elas sonham com uma divisão mais justa das tarefas para diminuir sua sobrecarga. Ainda é muito forte a postura de que as coisas em casa e na educação dos filhos ficam a cargo das mulheres. De uns 10 anos pra cá, a psicologia já corrigiu uma distorção e enfocou a relação pai e filho na construção do afeto de crianças e adolescentes. Mas é preciso alterar o papel de participante do pai para uma atitude de envolvimento e partilha em todas as esferas da vida familiar.

A postura do parceiro deve mudar?
Não só isso. Hoje vivenciamos a mudança de posição da mulher dentro da família. É preciso que os dois (homem e mulher) reformulem sua postura na criação de filhos e filhas. As tarefas domésticas não devem ser mais das mulheres e sim das pessoas, lembrando que geralmente os meninos são menos cobrados no cumprimento de rotinas de arrumação e limpeza da casa. Outra grande reestruturação precisa acontecer nas empresas. Apóio a Rosiska Darcy de Oliveira, que defende uma reengenharia do tempo em benefício dessa rotina feminina. Ela diz que as empresas deveriam flexibilizar horários e determinar uma programação por tarefa e não por carga horária. A reforma da relação com o trabalho e a vida nas cidades ainda é uma transformação profunda que está por vir. Não é um processo fácil, pois vivemos séculos de condicionamento. As mulheres travam batalhas individuais e coletivas. Não dá para esquecer que fazermos parte de uma trajetória composta de mulheres que vieram antes de nós e outras que ainda virão.

Como fazer para não ter expectativas demais se este sonho de partilha com o parceiro e de flexibilização de horários na empresa não se realizar?
Acho que a mulher precisa, acima de tudo, rever seus padrões. Existe uma super exigência em relação ao desempenho de todos os papéis. No momento em que consegue uma libertação dessas exigências ela já experimenta um alívio. Depois, é uma questão de colocar suas prioridades, avaliar o realmente importa. Uma problemática atual é a pressão que a mulher se coloca em relação à imagem do corpo perfeito. Sacrifícios absurdos são cometidos em função disso. Outra coisa que se deve levar em consideração é que os filhos são um aspecto importante da vida da mulher, mas não podem ser o centro de tudo. Girar a vida apenas em torno dos filhos não dá bons resultados, são maiores as chances de eles crescerem tirânicos, mal acostumados, sem valorizar o dar e o receber.

Maria Tereza Maldonado é mestre em Psicologia Clínica pela PUC-Rio e membro da American Family Therapy Academy. De sua riqueza de experiências profissionais (foi professora universitária, trabalhou em hospitais e em projetos sociais, além de ser consultora familiar), desenvolveu temas para as palestras que ministra por todo o Brasil com objetivo de melhorar a qualidade de vida na família e no trabalho. Publicou 28 livros e deve lançar em breve mais um, intitulado O bom conflito.

www.mtmaldonado.com.br

Sobre os temas mencionados na entrevista, Maria Tereza recomenda 2 de seus livros: HISTÓRIAS DA VIDA INTEIRA, que trata de pequenas mudanças no seu cotidiano para viver melhor e PALAVRA DE MULHER – HISTÓRIAS DE AMOR E DE SEXO, sobre o universo feminino, escrito em parceria com sua filha, a médica ginecologista Mariana. Ambos da editora Integrare.

Qual o sonho da mãe equilibrista?

[Maria Irene Maluf]

Conselheira vitalícia da Associação Brasileira de Psicopedagogia, Maria Irene Maluf é pedagoga e especialista em psicopedagogia. Vê passar por seu consultório muitas mães equilibristas e já passou por essa vivência. Atualmente suas filhas têm 30 e 29 anos.

Qual sua opinião sobre a mulher que trabalha, dá conta de casa, filhos, relacionamento?

Acho que os esquemas que as mulheres montaram fazem parte da estrutura de vida atual. A realidade nos empurrou para o mercado de trabalho e não havia suporte para isso. Assumimos os lugares de direito por sermos capazes e por tornar isso possível. As dificuldades foram sentidas na prática. A mulher saiu correndo em busca de uma rede de apoios e surgiram alternativas mais profissionais, como os berçários em período integral. Hoje percebo que muitas famílias estão optando por deixar as crianças com uma empregada de confiança em vez de contratar uma babá desconhecida. Outra escolha viável é a escola de período integral, que já existe faz tempo na Europa. As escolas hoje dão um suporte amplo, que inclui formação e informação, ensinam a criança a organizar seus estudos, a ter autonomia. Muitos têm dúvida quanto à escola de período integral, mas, além de ser um local socialmente destinado para a criança, é a garantia de profissionais de excelente formação e boa índole.

Com o que se preocupam as mães equilibristas?

Creio que uma das grandes ansiedades das mães é com a segurança dos filhos, tanto a física, o que inclui o medo de seqüestro, como a emocional. Elas querem sossego, mas ele dificilmente é alcançado. Ela ficará menos aflita se tiver um porto seguro para deixar o filho (escola, avó, pessoa de confiança). Por conta das novas famílias, com a enorme quantidade de pais separados, as crianças se tornam muito vulneráveis. Os filhos passam os finais de semana com outros casais e meio-irmãos e acontece todo o tipo de incidente, como um paciente meu que caiu de um brinquedo e quebrou as costelas em uma festa infantil. Ele estava acompanhado apenas de um meio-irmão. As famílias se ampliaram de tal maneira que é mais difícil controlar quais as influências que as crianças sofrem.

Essa nova realidade atrapalha?

A reestruturação dessa nova família é muito recente. Ainda não estamos dando conta disso. A mãe, com certeza, fica insegura da posição dos filhos nestas famílias. Teme perder as rédeas e também teme pelo desenvolvimento emocional e afetivo das crianças.

Mas você vê a mãe muito culpada?

Acho que passamos dessa fase, já mudou um pouco. A mulher sabe que não deve passar muito tempo com a criança e sim umbom tempo, um tempo exclusivo e dedicado. Ela não abre mão da carreira e conta com a ajuda da creche e da escola, do transporte escolar, das empregadas, de seus apoios, enfim. Diz “vou dar um jeito” e segue em frente. Se precisar, muda seus planos de trabalho, se adapta, mas segue em frente.

Maria Irene Maluf é pedagoga, especialista em psicopedagogia e conselheira vitalícia da Associação Brasileira de Psicopedagogia e dá palestras nas áreas de pedagogia e educação. Contato:irenemaluf@uol.com.br, tel. (11) 3258-5715.

Tempo para sonhar

[Maggi Krause]

E se, de repente, aparecesse para mim o Gênio da Lâmpada, modelo top de linha, daqueles que concedem três polpudos desejos? Acho que os meus seriam todos iguais… tempo, tempo, tempo. Afinal, fica mais fácil resolver o que fazer com essa dádiva divina depois da terrível hora da escolha! Já percebeu que tempo nunca é demais, não sobra, jamais parece ser suficiente?

A vontade é de me transformar numa mulher 30 horas, feito um famoso banco brasileiro… ué, será que porque agora eu uso a internet pra tudo ganhei 6 horas a mais automaticamente e nem percebi? Pra onde foram aquelas 2 horas que deixei de gastar no trânsito todos os dias? Sumiram… Como já dizia o filósofo, tempo foge! Pois é, corremos atrás dele e ele não nos dá uma folguinha!

Veja como os desejos a seguir, sonhados por mães equilibristas de variadas profissões e idades, na maioria das vezes tocam no assunto:  tempo para os filhos, tempo para o lazer, tempo para o marido. Tempo para se dar ao luxo de não fazer nada e ser mais feliz!

Sabe qual presente que eu adoraria receber no dia das mães? Uma secretária super hiper megaeficiente, que cuidasse de todas as chatices: pagasse as contas, sacasse o salário da empregada, supervisionasse o trabalho da empregada, fizesse as compras no supermercado, fizesse a lista de compras, devolvesse os DVDs na locadora, comprasse pão fresquinho todo dia, comprasse presentes para as festinhas de aniversário, jamais esquecesse de enviar as peças de sucata que a escola pede… Assim eu teria tempo para SÓ trabalhar e cuidar das meninas, o que já seria sensacional!
Flávia P.,
editora de gastronomia, filhas de 5 e 3 anos.

Mais diversão e menos trabalho,
mais dinheiro e menos contas pra pagar,
mais idas ao parque e menos idas ao pediatra,
mais tempo na TV e menos tempo no computador,
mais calcinhas de renda e menos de algodão,
mais Contigo e menos Exame,
mais pizza e menos alface.
E queria que todo o resto continuasse exatamente do jeito que está,
complicado assim mesmo…”

Patrícia De L. P. L.,
administradora de empresas, filhas de 5 e 2 anos, boadrasta de um menino de 8

“O meu presente de dias das mães é ter mais tempo para me cuidar. Passar mais tempo na academia, ter mais energia pela manhã e menos preguiça na hora de passar cremes e creminhos. Ou seja, deixar o trabalho quinze minutos mais cedo e ir tomar um “drink” (um suco, já que não bebo) com os amigos.”
Fernanda M.
, jornalista, filho de 10 meses.

Meu pedido é ter uma tarde durante a semana só para bater perna no shopping: andar bem devagar, jogar conversa fora com alguma amiga, tomar um café com biscoitinho com calma, ver as novidades na livraria sem correria, saber da “última moda” pelas vitrines das lojas de roupas (e não apenas pelas revistas). Tudo isso com uma condição: sem culpa por ter deixado o trabalho ou por não estar com a Luísa nessas horas.”
Renata P. L., administradora com mestrado em antropologia, filha de 10 meses.

Sonho com uma viagem para a Europa ou para o Chile. Detalhe: com tudo organizado, eu só precisaria ir para o aeroporto Internacional de Cumbica, e embarcar!
Cinthia de A. L. C
., arquiteta, mãe de 2 meninos.

Gostaria de ganhar alguns dias com 48 horas para ter mais tempo para meu filho! Acho que este é o desejo de todas nós, mães equilibristas!”
Patricia B.
, assessora de imprensa, um filho de 3 anos.

Pediria 15 kg a menos, além de cortina, colcha, lençóis e almofadas novas para o meu quarto, bem floridas e alegres. Com estes presentes me sentiria renovada!”
Daniela de L.

“Peço que meu filho seja um ser humano digno, correto, generoso, corajoso, carinhoso e que consiga passar aos seus filhos esta mesma herança que eu recebi e tentei passar a ele, pois creio que tendo isto você consegue o que sempre buscamos:  a felicidade!”
Mônica P
., profissional de marketing, filho de 14 anos.

“Bem, eu tenho dois motivos para pedir um presente especial no dia das Maes: SOU MÃE e é meu aniversário. Estou sonhando com uma semana  inteirinha em um spa maravilhoso, sendo paparicada o dia inteiro, só recebendo carinho.”
Ana K.
, empresária, dois filhos.

“No dia das mães quero que ninguém me peça nada! Que eu não tenha que cuidar de ninguém! Que não tenha que dividir minha atenção com ninguém! Quero um sossego acompanhado das pessoas que amo, que nesse dia não precisarão de mim para nada.
Dá pra entender? Um dia sem pratos pra equilibrar!

Suzi R.
, autônoma, filho de 14 anos.

Ter tempo para cuidar do espírito e do corpo, e poder emagrecer mais ou menos uns cinco quilos!”
Amara Lousiene S. P.
, enfermeira, uma filha de 5 anos.

“O que eu gostaria de ganhar no dia das mães? Certamente seria TEMPO. Mas não seria para me dedicar mais a algo que não consigo em um dia normal ou para ficar mais com os meus queridos filhos e marido (e – definitivamente – também não seria para terminar aquela apresentação que está pendente). Quem trabalha fora sabe que, nos dias de hoje, até a ida ao cabeleireiro já virou uma tarefa a mais. Queria mais tempo para fazer NADA. Sabe, uma horinha por dia para esvaziar os pensamentos e ouvir a própria respiração? Pois é, adoraria gastar esta horinha com bobagens sem nenhum propósito e planejamento.  E com todas as coisas menos nobres que toda mulher a-do-ra: falar ao telefone com uma amiga, assistir um programa de tv bem ‘sem conteúdo’ tipo ‘como reformar a sua casa em 1 semana”; sei lá, andar mais devagar, comer mais devagar, parar para olhar a paisagem.”
Candice P.
, assalariada, filhos de 3 e 1 ano.

Simplesmente pai

[Daniel Billio]

Cresci sem pai numa família repleta de mulheres. Meu avô e um tio faziam o papel de figuras masculinas, mas como não apitavam quase nada na rotina da casa, cresci com a certeza de que as mulheres mandavam no mundo. Ao longo dos anos fui trabalhando calmamente o meu Édipo – às vezes nem tanto – e, sem complexos, me apaixonando por mulheres fortes. Casei e, chegada a hora de perpetuar a espécie, adivinhem o que eu pus no mundo? Uma menina. Dois anos depois, pus outra. Agora vivo, definitivamente, cercado de mulheres por todos os lados.

Essa estreita convivência com o universo feminino causou em mim uma distorção na percepção das diferenças entre homens e mulheres. Na verdade nunca percebi diferença alguma, salvo as anatômicas, claro. Não sei se as mulheres da minha família eram muito masculinas, e os homens muito femininos, o certo é que pra mim era tudo igual. Era. A paternidade curou minha miopia. Não existe nada mais diferente do que um pai e uma mãe. Se o pai é homem e a mãe é mulher, logo, não existe nada mais diferente do que um homem e uma mulher. Gênio!

Como eu já disse, cresci sem pai. Essa ausência – que pelas minhas contas já custou uma casa confortável em Camburi, só de terapia – me deu a oportunidade de ser pai do zero. O pai que eu sou é uma invenção minha. Provavelmente sou o pai que eu gostaria de ter tido. Bom, esse pai que eu inventei pras minhas filhas é conhecido no mercado como o “pai participativo”. Uma espécie de semideus, um tipo evoluído de homem capaz de dar banho, trocar fraldas, cozinhar e dar o almoço, botar pra dormir, levar no balé e combinar direitinho a roupa pra sair. Eu não sou um pai participativo, eu sou uma mãe, certo? Errado. Nada é aparentemente assim tão simples. Minha mulher vai ser capaz de perceber pequenos detalhes em todas essas ações que me desqualificam sem dó nem piedade para o papel de mãe. Detalhes que só uma mãe percebe. Detalhes forjados numa combinação de perfeição, culpa, ciúme, posse e um tipo de afeto que homem nenhum consegue entender, por mais feminino ou participativo que seja. No filme Cassino, de Martin Scorcese, o gângster interpretado por Robert de Niro diz uma frase que poderia sair perfeitamente da boca de uma mãe: “Existem três maneiras de fazer as coisas na vida. A certa, a errada e a minha.”

Minha mulher é uma equilibrista. Às vezes por necessidade, às vezes por gosto. E, como diria minha avó, “quem corre por gosto não cansa”. Como tudo que exige técnica, quanto melhor você fica, mais longe quer ir. Cansei de tentar entender por que minha mulher exige tanto dela própria, das meninas, de mim. Também não sofro mais por não conseguir agir como ela agiria. Desisti de tentar ser mãe e estou me divertindo com o papel de pai. Aliás, sem essa de participativo. Simplesmente pai. Faço o que posso e ajudo porque gosto. Nos dias em que o número de equilibrismo falha, me contento com o papel de rede de segurança. Tá bom demais.

Daniel Billio é roteirista e diretor de TV e, se dinheiro caísse do céu, teria mais filhas.

Visões para o futuro

[Ana Dini]

Deus criou os sonhos para indicar o caminho aos homens, quando esses não podem ver o futuro.

Assim diz um livro de sabedoria do Egito antigo. Em sua história, o sonho tem caráter premonitório. E esse aspecto interessa às mães de modo particular. Por sermos mulheres e termos, de modo geral, a ansiedade como guia de nossas ações, projetamos com facilidade incrível tudo que ainda esta por vir.

É claro que a maternidade traz consigo uma mudança de condição, mas que em nada afeta a nossa essência ansiosa. Se antes sonhávamos em ser mães e o como seria a nossa vida a partir disso… com o nascimento da criança  passamos a sonhar e aspirar por ela. Talvez seja por isso que passamos a trabalhar carregando tanta culpa e sentimento de incerteza: nunca sabemos se estamos fazendo a coisa certa.

Eu, assim como a maioria, logo que me soube grávida, pensei em ter tempo para o meu filho. Queria vê-lo crescer e nem em pesadelo poderia pensar em trabalhar o dia todo. Como ficaria com ele? Mas, mais tempo, muitas vezes significa menos recursos financeiros e era o meu caso. Como promover, com tranqüilidade, tudo que garantisse o seu bom futuro?

A escola que possibilita a melhor formação não é qualquer uma, tem também os cursos: esportes, línguas, música… e as viagens? Ele precisará conhecer o mundo para se destacar e ter a possibilidade de disputar no mercado de trabalho a profissão que desejar e que lhe renda benefícios financeiros.

Logo percebi que era melhor trabalhar e muito. Então, ele foi crescendo e começou a se interessar pelos amigos. Queria trazê-los para brincar em casa. E aí? Nossa, eu não vou estar em casa para recebê-los? Como conhecerei os amigos de meu filho para avaliar se eles são bons o suficiente para ele? Sem dúvida é melhor ficar em casa.

Só assim poderei acompanhar as suas lições, ir buscá-lo e levá-lo à escola, às festas, à casa de amigos. Ter um olhar atento e cuidadoso acompanhando todos os seus passos. Dependendo do ponto de vista, isso pode ser um sonho ou um pesadelo!

Ver meu filho crescer e eu sempre por perto. Mas, até quando? Ai, de repente me deu um medo! Ele vai crescer, vai se transformar em um homem alto, não muito magro, mas também não muito gordo, querido, honesto, justo, responsável, otimista, verdadeiro, corajoso, forte, determinado, que tenha uma vida saudável e que seja seguro. Eu terei sido a responsável por esse homem.

E depois ele se casará… já sonho com a vida familiar que ele virá a ter. Penso nele com filhos vindo me visitar, tendo uma vida independente e feliz. Com quem ele se casará? Certamente com uma mulher bonita, vaidosa, dedicada à vida, bem sucedida, que saiba o que quer, que seja sua companheira, uma mulher e… espera aí. Tem um ponto importante e que não pode ser negligenciado: os homens procuram mulheres parecidas com suas mães. Já ouviu falar sobre isso?

Não quero que ele se case com alguém que queira ou precise tomar conta dele ou que o sufoque por não ter vida própria, quero que ele se case com uma mulher de verdade e essa mulher trabalha, é segura, faz mil coisas ao mesmo tempo e ainda é capaz de fazer o filho feliz porque está feliz consigo mesma ou ao menos busca ser feliz.

Procurar o meio termo é a melhor solução, trabalhar meio período é o meu sonho. Nesse caminho do equilíbrio, realizo meus sonhos e dou espaço para que o João, meu filho, um dia realize os seus.

Ana Dini é educadora, formada pela USP-SP, especialista em Educação Infantil. Há 18 anos atende crianças e pais em escolas de grande porte. Ministra o workshop “Como falar para o seu filho ouvir”. Contato: anapdini@hotmail.com